A substância retirada de um anfíbio da Amazônia, usada pelos índios em rituais xamânicos e pelos caboclos como remédio, foi proibida pela Anvisa.
Remédio ou veneno? Uma substância extraída de um sapo da Amazônia vem sendo usada como um suposto remédio pra várias doenças. Só que na verdade pode até matar. A polícia investiga quem está por trás desse comércio proibido, como mostra agora o repórter Marcelo Canellas.
Maravilha curativa? “O kamboa é um depurativo da limpeza do sangue, da pele, corta tipo de diabetes, colesterol, problema de doenças infecciosas. Ele vai curando tudo”, explica o ambulante José de Sousa.
Ou um veneno mortal? “Ele tomou o negócio e, em um minuto ou dois, ele passou mal, foi para o banheiro, evacuou e enfartou no banheiro, lembra uma testemunha.
Uma substância retirada de um anfíbio da Amazônia - usada pelos índios em rituais xamânicos e pelos caboclos como remédio - foi proibida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Conhecida como vacina do sapo, ela é objeto de uma investigação policial que envolve contrabando, biopirataria e até a morte de uma pessoa.
Estivemos no oeste do estado do Amazonas, a caminho de Atalaia do Norte. No local não há quem ao menos não tenha visto os poderosos efeitos da vacina do sapo.
“Já vi, mas não tive coragem, porque a pessoa passa mais de vinte minutos fazendo efeito, o negócio lá”, diz o taxista Raimundo Falcão. Ele conta que já levou muita gente ao local.
O táxi nos leva a um aldeamento dos índios marubos. Eles acabam de chegar da mata. Eis o famoso kambô, kampô ou kamboa, como é chamado dependendo da região da Amazônia, cujo nome científico é philomedusa bicolor.
“Ele tem hábito noturno, então de dia parece que fica meio molinho. Os índios amarram as patas do bichinho e o esticam entre duas estacas.
O pajé raspa levemente o corpo do animal para extrair o veneno. Ao fim da retirada, os índios devolvem o bicho à mata. A substância pastosa é colocada numa palheta de madeira. Os marubos tomam a vacina desde cedo.
O pajé usa um pedaço de cipó incandescente para queimar a pele do garoto. Depois, aplica a secreção diretamente na queimadura. O veneno entra na corrente sanguínea e começa a agir. Sabendo que vai passar mal em poucos segundos, o garoto corre para a beira do rio. A irmã dele, Neidilene Marubo, tenta ajudá-lo. “Ele está se sentindo tonto. Sente a cabeça rodando e dá vontade de vomitar”, conta.
Em seguida, é ela quem toma a vacina. “Tenho medo, mas tem que tomar para tirar a preguiça e poder trabalhar”, diz Neidilene.
Eles acreditam em poderes mágicos. Tomando a vacina, os homens se tornam caçadores hábeis. As mulheres ganham destreza para o artesanato.
E todos sentem o mesmo desconforto. São poucos minutos e o efeito é quase imediato. Apesar desse sofrimento todo, os índios vivem assediados por gente que vem de longe em busca da secreção. Horácio Marubo de Oliveira revela: “Já veio gente de vários lugares, estrangeiros”.
“Nos preocupa muito na Funai a venda desse conhecimento agregado também, o conhecimento xamânico do povo marubo, como vocês estão aqui entrevistando eles”, afirma o coordenador regional do Vale do Javari Bruno Pereira.
A Funai já recebeu dezenas de denúncias: estrangeiros estariam comprando o veneno do kampô em várias partes da Amazônia.
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